Se na estreia o jogo tudo prometeu e pouco cumpriu, pode-se dizer que agora a série se encontrou
Assim como no primeiro jogo da série, o protagonista é capaz de fazer praticamente tudo com seu smartphone: mudar semáforos, hackear câmeras de segurança, invadir conversas de outros celulares e por aí vai. A chamada “internet das coisas” testa seus limites e deixa o jogador pensativo sobre como tudo aquilo que é mostrado na tela é completamente possível de ser feito.
O que está em jogo aqui é a grande moeda de troca do século 21: a informação. Gigantes da indústria obtêm dados sobre praticamente tudo que você consome. Seu seguro de vida sabe das muitas pizzas que você comeu e vai encarecer o seu plano de saúde. Seus hábitos de compra se tornam algoritmos para te oferecer outros produtos – algo que já é visto hoje em qualquer navegador. É neste contexto, bastante próximo das discussões éticas que tomaram conta não só de enredos no entretenimento, mas também do debate filosófico sobre o futuro da humanidade que o jogo se concentra.
Diferentemente da primeira versão, onde um drama pessoal estava no centro de toda a história, desta vez você é Marcus Holloway, um hacker jovem e bem humorado que se une com um grupo de experts no ramo – o Deadsec, algo como um Anonymous potencializado – para combater o “mal” do sistema que usa seus dados.
Sua missão principal é uma só: conseguir o máximo de “curtidas” possíveis para o aplicativo da gangue Deadsec nas redes sociais, para ganhar mais poder nesta sociedade que valoriza tanto os dados de usuários. Quanto mais pessoas baixarem o aplicativo, mais fácil de utilizar as ferramentas de hackeamento e mais habilidades surgem para serem experimentadas no gigante mapa da Baía de São Francisco, na Califórnia.
E para atingir tal objetivo, vale lançar mão de tudo – até fazer selfies. O nível de detalhes da trama para fazer com que você realmente pense que está naquele universo é bastante divertido. O smartphone do protagonista pode ser aberto como se fosse um menu do jogo e permite ao jogador acionar músicas (parece, mas não é Spotify), chamar um carro (mas não é Uber), buscar missões e, sim…fazer fotos suas em meio a uma briga ou em um cenário bonito e publicá-las nas redes sociais (em uma rede social que também não é Facebook).
Você se verá cumprindo missões que certamente caberiam em uma série de TV. Em uma delas, por exemplo, terá de invadir a sede de uma falsa igreja para provar que ela mente para seus fiéis e até utiliza relíquias de mentira para fidelizá-los. E como provar isto? Quebrando as relíquias e postando o vídeo na internet, é claro.
A história do jogo flui como uma comédia americana para assistir sem compromisso. A localização dos diálogos para o português ficou ótima e muitas expressões usadas pelos personagens são bem próximas da realidade. É possível que um jogador com seus 30 e tantos anos possa estranhar algumas gírias, mas, acredite – alguém mais novo provavelmente as utiliza no dia-dia-dia. Palavrões e piadinhas entre os hackers acontecem o tempo todo – eles se comunicam constantemente entre as missões – e deixam o jogador, ainda que no modo single player, com uma sensação de estar acompanhado o tempo todo.
Jogabilidade
Watch Dogs 2 entra na “modinha” do jogo de furtividade (stealth) e ação, o que, neste caso, é bastante gratificante. Em um cenário gigante com uma infinidade de personagens e prédios para interagir, nada melhor do que poder cumprir as missões com muita liberdade. A evolução do personagem por meio dos pontos de experiência ajuda a escolher que caminho seguir: o do espião silencioso, que tenta fazer tudo sem que ninguém perceba, ou do serial-killer que sai metralhando tudo que vê. Há, inclusive, uma decisão ética muito clara desde o começo: é possível passar o jogo todo sem matar ninguém, usando apenas pistolas e bombas de choque. Depende de você.
Até os famosos drones têm vez neste segundo game da saga, seja na via terrestre, seja pelo ar. E isto é divertidíssimo. É possível invadir as salas que você quer em saídas de ar minúsculas com auxílio do robô controlado em seu notebook e até observar a cidade do alto de seus prédios sem sequer estar lá.
O nível de dificuldade é considerável: diferentemente de outros jogos de jogabilidade semelhante, a morte é muito próxima aqui. Se você brigar com alguém na rua, o personagem pode sacar uma arma, dar dois tiros e pronto. Você morre. Não há um colete à prova de balas infinitas nem aquelas bizarrices dignas de um desenho animado, como cair de um penhasco e continuar vivo.
A realidade para aí: se por um lado os tiros são bastante mortais, manobras perigosíssimas no trânsito não representam perigo algum. Prepare-se para bater inúmeras vezes, capotar o carro, e sair ileso, sem nenhum arranhão. Isto pode até ajudar a fazer o jogo mais dinâmico, mas certamente o distancia da realidade que tenta passar praticamente todo o tempo.
Há uma série de armas que podem ser utilizadas – você as imprime em uma impressora 3D de sua base, em troca de dinheiro. O jogo também deixa uma série de armadilhas que podem ser hackeadas contra os inimigos, como bueiros que explodem e outros objetos que explodem e podem matar ou só dar choque. Também é possível distrair os inimigos mandando sinais a seus celulares ou até colocar uns contra os outros. Tudo de forma muito simples e intuitiva.
Outra coisa que impressiona é a interação dos personagens não jogáveis durante o game. Todos têm algo a dizer e oferecem reações diferentes conforme a sua interação. Você pode elogiar, ofender e até flertar com qualquer um. Ao brigar, pode ser espancado e até morrer por qualquer um, de forma aleatória. Os puzzles também estão de volta, mas de forma muito mais leve e moderada – os do primeiro game eram chatíssimos e demorados. Basta ligar os pontos para conseguir hackear o sistema de determinadas missões, nada de outro mundo e nada que tire a adrenalina da missão como um todo.
Vale a pena? Sim. Watch Dogs 2 traz a essência promissora do primeiro game com uma produção muito mais detalhada e bem feita. É como se a primeira versão fosse apenas um teste para o que estava por vir. Se na estreia o jogo tudo prometeu e pouco cumpriu, pode-se dizer que agora a série se encontrou. Se você gosta de distopia, tecnologia e jogos de mundo aberto, esta certamente é uma excelente opção. E para durar. Luiz Fernando Toledo_Agência Estado
Fonte: http://liberal.com.br
Imagem: Divulgação
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